Futebol, política e cachaça

terça-feira, 20 de maio de 2008

Mojica – Jânio Quadros, ditadura e shows de rock

A bomba: Jânio Quadros renunciou pressionado por militares. É a versão revelada por Mojica nesta entrevista. O cineasta fala ainda sobre sua relação com a ditadura militar. Ele explica ainda que só faz performances em shows de heavy metal porque tem fãs ali, mas não suporta o som dos metaleiros.


Futepoca/Diplô – Quanto à política, você foi candidato conduzido por Jânio Quadros...
Mojica –
Meu problema com o Jânio é que eu gostava da maneira de ele falar. Era uma maneira honesta. Não queria saber se estava ofendendo fulano ou não, falava o que sentia. Nem que ele tivesse de ser exilado como foi, tirado fora da presidência. Mas ele não sentiu mágoa.

Futepoca/Diplô – Quando ele renunciou...
Mojica –
Renuncia, à força. Ele foi pressionado. Estive com a filha dele, que aliás até me passou um roteiro que até hoje não fiz. A filha de Jânio estava em alto mar, se comunicando com ele. Ou ele renunciava, ou a matariam. Isso ninguém sabe. Matariam a filha dele. Teve de renunciar na marra. Porque mesmo com aquela história da vassoura, ele era humano como vocês e não queria que a filha morresse. A filha era muito patriota, achava que ele não tinha que renunciar, que ela tinha de morrer. Se fizerem a história do que ele me contou, real, é dramático o momento.

Futepoca/Diplô – Essa filha era a Dirce Tutu Quadros?
Mojica –
Eu acho que sim. Só que ele nunca quis colocá-la em risco, mas ela foi contra isso, achava que tinha de morrer e Jânio continuar presidente. Ele tinha idéias doidas, mas é aquilo que a gente chama de "idéias avançadas". Não se aceitava isso. Foi feita uma chantagem muito grande, ele teve de guardar segredo e morreu com ele. Contou para mim e poucas pessoas. Não sei se alguém vai se atrever a escrever um livro e enfrentar os militares.

Ditadura militar

Futepoca/Diplô – Como foi sua relação com a ditadura militar?
Mojica –
Fui preso, só que não saí do país.

Futepoca/Diplô – Você foi preso quatro vezes, não?
Mojica –
Várias. Mas não saí do país. Não sei se pelos filhos, se era para provar alguma coisa, mas aceitei o desafio... para ver o que acontecia. Fui muito brecado. Se não me brecam, o que o Silvio Santos tem na televisão eu teria no cinema. Derrubava Mazaroppi, derrubava tudo. Ficaria forte e até se eu quisesse montar uma televisão poderia.

Futepoca/Diplô – O senhor acredita que ainda é possível?
Mojica –
Acredito. Apesar da minha idade. Mas posso viver uns dez anos mais e conseguir muita coisa. Porque este ano é um ano meu. Não só pelo [programa no] Canal Brasil, que assinei o contrato, como pelo Encarnação..., que vai dar muito o que falar, e A Praga, com Wanda Cosmo, iniciado em 1981, terminado ano passado, que será lançado depois. Só acho que as pessoas podem confundir e achar que é continuação do Encarnação.... Mas vai ser lançado depois, quatro meses depois.
Já tenho uma proposta de começar no meio do ano O Devorador de Olhos pela própria Olhos de Cão, do Paulo Sacramento, o produtor que fez O Prisioneiro da Grade de Ferro, Amarelo Manga e outros. Um cara de prestígio. Este ano é o meu. Saindo Encarnação..., o Brasil pára. Nunca ninguém fez, sou o único a fazer o gênero. Mas esse está mais soft do que se pode pensar. Os americanos vão se prostrar. Tenho muitos fãs, muita força nos Estados Unidos. Basta dizer que, aqui, levei 50 anos para ter 50 capas de revista. Em Nova Iorque, em um mês tive 50 capas. Lá tenho fãs que não param de falar da minha obra e tem gente escrevendo minha biografia, deve sair este ano ou no início do próximo.

Futepoca/Diplô – O Tim Burton, o Quentin Tarantino admiram seu trabalho.
Mojica –
Admiram e copiam, o [White] Zoombie, um grupo que veio [ao Brasil], visitaram meu estúdio e fizeram uma fita baseada no Esta Noite [Encarnarei no teu Cadáver]. O Ramones, que se acabou, também. Tinha até há pouco tempo uma jaqueta deles que o João Gordo me cobra, mas de tanto pegar para mostrar, alguém sumiu com ela. Mas lá eu tenho uma força muito grande com os conjuntos de rock. Aqui nem se fala. Com os Titãs, Sepultura, Ratos de Porão. As bandas me chamam demais para comerciais e apresentações. Acho que estou com meu povo, com o pessoal que gosta de mim e também faço o que eu gosto.

Futepoca/Diplô – O que o senhor faz nos shows de rock?
Mojica –
Faço performances... Sou ator, amigo. Sou ator. Se me perguntar quais são minhas músicas que gosto mesmo, são Dalva de Oliveira, Nelson Gonçalves, Francisco Alves, Ângela Maria, Altemar Dutra... Ah, Elis Regina. Do rock é só o famoso que morreu sem eu poder fazer o “Trem das Sete”, o Raul Seixas. Sai daí, é tudo mentira. Ouço por ouvir. Fiz [uma lista com] as dez músicas mais. Nove foram dos anos 60 e 70. A única que aprovei no ano passado foi a história do Mamute, uma comedinha que realmente gostei. Gosto de música de natal...

Futepoca/Diplô – Mas nas trilhas sonoras o senhor trabalha com músicas bastante variadas. Às vezes, há cenas de muita tensão e ao fundo se escuta “Raindrops keep falling on my head”. Como é trabalhar com a trilha sonora, em que uma cena de violência aparece com música de natal?
Mojica –
Acho que tem muito do ser humano. Numa cena de sexo no Despertar da Besta, toco "Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar...". Com isso mostro uma falsidade que há nas pessoas. Será que a criança está pensando no "Cirandinha-cirandar" ou ela está já com segundos propósitos? Hoje, uma menina de 11 anos, você começa a falar de coisinha assim ela vira e fala: "Você é antiquado". Estamos em outro mundo. O Despertar foi um filme que, praticamente, vim para o futuro mostrar que essas músicas natalinas, de criança, já diziam algo mais. Já fizeram várias versões com tudo o que é palavrão nessas músicas. Mas fiz, porque iríamos chegar nesta época.
Por isso pensei que, lá fora, não iriam entender, são músicas brasileiras, mas entenderam.

Futepoca/Diplô – No Despertar tem a música de A Ponte do Rio Kuwai...
Mojica –
É uma gozação que funciona muito. Gosto de satirizar. Em Encarnação acho que não vou poder fazer isso, fizemos uma trilha de outras fitas, porque vai no sentido de continuação e fim de uma trilogia. Então, não dá para satirizar.




Confira:
Parte 1 – A cachaça Zé do Caixão
Parte 2 – Cinema: do medo à Encarnação do Demônio
Parte 3 – Jânio Quadros, ditadura e shows de rock
Parte 4 – Censura, drogas e álcool
Parte 5 – Crítica, público e inspiração
Parte 6 – A obra-prima Finis Hominis e projetos futuros
Parte 7 – Futebol e Corinthians, com direito a praga

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