Futebol, política e cachaça

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Belluzzo – Luxemburgo e Lula são gênios do povo brasileiro

Parte 2 da entrevista com Luiz Gonzaga Belluzzo, economista e diretor de Planejamento do Palmeiras.




Futepoca/Diplô – Mas o Luxemburgo não é o contrário disso tudo, por ser muito centralizador?
Belluzzo –
É uma ilusão achar que o Luxemburgo é assim. Nós conversamos com ele sobre eventualidades... digo “nós”, quero dizer diretoria de futebol, porque não costumo me meter no futebol. Como sou muito fanático, é melhor não (risos). Porque senão vou ficar dando palpite errado, porque o torcedor não raciocina.
Nós sabemos que vamos ter que vender jogador, mas trabalhamos para substituir esse atleta. Deixa explicar a experiência do Luxemburgo. Foi técnico do Bragantino, campeão em 90, depois foi para a Ponte Preta e ficou trinta dias, indo embora. O Palmeiras começou a montar aquele time de 93.

Futepoca/Diplô – Com o Otacílio Gonçalves.
Belluzzo –
Isso, uma vez o presidente do Guarani comentou: “vocês estão dando um boeing pra um piloto de teco-teco”. Uma maldade, o Otacílio era uma ótima pessoa. Daí fomos atrás do Luxemburgo, uma pessoa esperta que, aliás, tem uma inteligência acima da média, como treinador de campo, a capacidade de ver o jogo, de mudar o jogo, não tem coisa igual. Ele é tão bom que até o Mustafá [Contursi] reconhece isso. Porque o Mustafá não gosta de treinador nem de jogador de futebol, poderia ser presidente de clube de carteado ou de críquete.
O Luxemburgo é muito bom avaliador de jogadores. Quanto ele trouxe o Léo Lima, foi um verdadeiro escândalo. Mas ele tem essa coisa, pode ter muitos defeitos, como todos nós, mas dá oportunidade pro sujeito que está fracassando. E, pra mim, o Léo Lima foi o melhor jogador na partida contra o São Paulo, jogou demais. Hoje em dia, o treinador tem muito peso. Ele não é só o Luxemburgo, tem alguém que filma pra ele e quando vai jogar com o São Paulo sabe como o time vai jogar. Tem um preparador físico e um fisioterapeuta que são de primeira linha. O Élder Granja jogava uma partida no Inter e se machucava, agora joga todos os jogos. Ele ajudou muito, e o Leão também, o centro de treinamento do Palmeiras era uma verdadeira sucata. E tivemos como planejamento fazer um centro de recuperação igual ao do São Paulo, e hoje é melhor que o do São Paulo. A infra-estrutura do futebol ninguém vê, vê quando o time entra em campo. Veja hoje, o gerente de futebol é o Toninho, um sujeito esclarecidíssimo, que estudou administração do esporte, não é um curioso. É muito ponderado, tirando o dia em que ele chutou a porta do vestiário do juiz, mas esse é o lado torcedor (risos). E se integrou muito bem com o Luxemburgo.
Digo que o Luxemburgo vale o que recebe, porque o conjunto dos jogadores passa a valer mais com ele, e isso é bom pro clube.

Futepoca/Diplô – Mas como incorporar isso ao clube? Porque ele é ele...
Belluzzo –
Mantivemos a comissão técnica do Palmeiras pra trabalhar com ele, para que eles aprendam o que tem de melhor em matéria de comissão técnica no Brasil. Mantivemos os fisioterapeutas, os médicos e isso aumentou a folha. Mas é um custo que vale a pena pagar. O Lulinha, filho do Lula, foi para o Palmeiras porque ele quer ser técnico de futebol e quer trabalhar com o Luxemburgo, aprender como ele trabalha. Há muita parolagem e mistificação sobre o Luxemburgo. Ele é privilegiado, como é o Felipão. O Felipão não é melhor que o Luxemburgo, mas é um paizão, faz o atleta jogar pra ele. Já o Luxemburgo é um cara que chega no vestiário, o time está perdendo e grita: “Seus m..., vocês não estão jogando nada”. Vocês viram o que ele fez com o Léo Lima outro dia? Inventou de fazer um passe de trivela e escutou “Vai tomar no c...”. Mas é assim que funciona no mundo da bola. Depois que terminou o jogo, acabou.
Qual era o problema do Caio Júnior? Era uma ótima pessoa, uma flor, casaria minha filha com ele, já almocei várias vezes com ele. Mas ele não dava pro jogador a impressão de que queria ganhar o jogo. Intelectual não dá pra ser treinador de futebol, o cara fica em dúvida. O outro está deprimido, tem que chegar e dizer: “tem que jogar”.
Joguei muito futebol e sei como é, você tem que mandar, puxar o cara pra jogar. O cara que está meio medroso, tem que falar: “ô, seu merda!”. O Luxemburgo conhece a psicologia do atleta, que de vez em quando desiste. É muito freqüente o breakdown psicológico. Às vezes o jogador perde um gol, perde dois, perde três, começa a achar que a coisa não vai. Tem que ter um sujeito que incentive, é assim esporte de alto rendimento.
Digo que o Brasil produziu algumas figuras excepcionais. Um na política, você pode até discordar dele, mas o Lula é um fenômeno do povo brasileiro, veio lá de Garanhuns e virou presidente do Brasil. E ele aprende qualquer coisa, é capaz de falar pra você o que você acabou de explicar melhor do que você falou. E o Luxemburgo é outro gênio do povo brasileiro. São dois projetos, duas personalidades, que tem essa coisa da intuição. O Luxemburgo fez curso de treinador? Nunca fez, agora tem um curso para treinador.
Por que, em geral, os técnicos não foram bons jogadores de futebol? Com exceção do Muricy, que foi bom jogador e é um excelente técnico. O que era o Luxemburgo? Um lateral esquerdo muito mequetrefe, mas é um cara que tem o dom da observação. Pede pro Pelé falar sobre tática de futebol. Só fala bobagem, não dá uma dentro. Compreender o jogo e jogar bem é para poucos, mas o Luxemburgo, se não fosse um bom técnico, ninguém lembraria que jogou no Flamengo, no Internacional. Foi reserva do Júnior que, ao contrário, era craque e não deu certo como técnico. Quem foi bom jogador e é bom comentarista é o Müller.

Futepoca/Diplô – Mas não se compara com a inteligência dele dentro do gramado...
Belluzzo –
Ele tinha uma inteligência espacial fantástica. O Pelé tinha uma inteligência dentro do campo anormal. Hoje, tem um jogador no Brasil que tem uma inteligência muito grande, não estou dizendo que ele é o Pelé, mas possui a intuição da jogada antes do outro, que é o Valdivia. O pênalti do Júnior nele é típico de quem vê o jogo antes [no jogo contra o São Paulo, na primeira fase do Paulista, vencido pelo Palmeiras por 4x0]. Ele é um raio, um jogador muito engraçado. Acho uma pena se um dia ele sair do Palmeiras, mas é uma figura muito engraçada, não sei se os adversários acham isso (risos).

Futepoca/Diplô – Quando o Palmeiras ficou fora da Libertadores, ele chorou...
Belluzzo –
É uma criança, tem reações de criança. Ele se identificou com o clube.



Confira:
Parte 1 – Palmeirenses não gostam que eu diga, mas São Paulo é mais profissional
Parte 2 – Luxemburgo e Lula são gênios do povo brasileiro
Parte 3 – Marcos, a anticelebridade, e o dinheiro no futebol
Parte 4 – Na reunião com Lula, os desafios para o Brasil e para o mundo
Parte 5 – Novo Bretton Woods e a China

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